Junho 05 2016

Dois acontecimentos recentes motivam este meu comentário. A reação de alguns lisboetas aos planos para a construção de uma Mesquita em Lisboa, e a tentativa do PAN, PEV, BE e 10 Deputados do PS iniciarem um processo de destruição da Festa de Toiros (como se não bastassem os que, de dentro, a vão minando com os seus comportamentos).

O que une os dois acontecimentos? A intolerância, o preconceito, o autoritarismo, a discriminação, a ignorância e a prepotência. As mesmas que levam ao abuso sobre as crianças, à violência doméstica, à exclusão social, à segregação de quem é diferente das maiorias em matéria cultural, de sexo e orientação sexual, de idade, de cor da pele, de nacionalidade ou de estatuto social. Matérias muito diferentes, mas com o mesmo denominador comum. Vejamos então estes dois casos.

Quanto à Mesquita. A Constituição da República Portuguesa consagra a independência do Estado em relação a qualquer Igreja ou Religião e o princípio da liberdade religiosa. Desde sempre em Lisboa coabitaram pessoas professando diferentes credos, todas elas praticando livremente os seus cultos. Há até uma Mouraria na nossa capital. As exceções a estas regras constituem momentos negros da época medieval, com a perseguição a certas comunidades religiosas, como os Judeus.

Por causa das organizações terroristas que se dizem islamitas e dos ataques que têm sido perpetrados de forma bárbara, em nome da Fé (não interessando agora olhar a história das religiões e das relações entre os povos que as professam, nem os conflitos que tantas vezes se desencadearam em nome de um deus, quase sempre com a religião a ser cavalgada por outros interesses bem mais prosaicos, onde se podem encontrar as causas do terrorismo) muitas pessoas têm passado a olhar de maneira discriminatória todos aqueles que acreditam no Profeta. Fazem-no de forma irracional, movidas pelo medo e pelo ódio, que cega e leva à rejeição dos muçulmanos como se fossem todos iguais.

Muitas dessas pessoas não conseguem ver, tal a cegueira xenófoba, que com isso só alimentam por um lado, os próprios terroristas que visam espalhar o ódio, e, por outro lado, aqueles que provocam e alimentam os conflitos no médio oriente porque isso convém aos seus negócios.

Impedir a liberdade religiosa dos muçulmanos de Lisboa é fazer o mesmo que fazem tantos países do mundo árabe em que o culto de religiões que não as do Islão é proibido e selvaticamente reprimido. Como aliás se reprime toda e qualquer liberdade de pensar. Não podemos ser iguais a eles. Porque não podemos ser aquilo que condenamos. E porque isso é estúpido: ataca-se uma esmagadora maioria de cidadãos dignos satisfazendo os objetivos de criação de instabilidade, tensão e conflito perseguidos por uma minoria de fanáticos assassinos.

Tem, por isso, toda a razão a Câmara de Lisboa no que respeita à construção da Mesquita, e estão totalmente erradas as pessoas que, acicatadas por políticos populistas de direita, se manifestam contra a liberdade religiosa. Estão a manifestar-se, ao fim e ao cabo, contra a sua própria liberdade.

Aparentemente da esquerda, mas felizmente apenas do PEV, do BE e de uma dezena de imbecis do PS (do PAN recuso-me a falar), têm vindo os ataques à tauromaquia. De forma cobarde, usando pretextos diversos como o combate ao trabalho infantil, a promoção da escolaridade, o bem  estar animal, a defesa psicológica das crianças e a prevenção da violência, esses partidos apresentaram na Assembleia da República uma série de propostas de Lei que visam, caminhando “step by step”, acabar com a Festa de Toiros em Portugal.

Querem acabar com uma cultura (é assim que a lei portuguesa considera a tauromaquia) por decreto, apenas porque não gostam. Não faz parte dos seus padrões valorativos. Nunca fizeram o mínimo esforço para a compreender. Assumem apenas uma atitude arrogante de quem se sente superior aos seus concidadãos (até aos seus militantes de terras aficionadas). Mais civilizados, mais pacifistas, mais “amigos dos animais”, mais sensíveis e mais cultos. Quando no fundo são apenas mais ignorantes, pois a arrogância é irmã da ignorância.

No fundo o que pretendem é coartar a liberdade cultural, a livre expressão da identidade cultural de uma parte significativa do nosso povo, numa lógica de dominação e fascismo cultural absolutamente inaceitáveis. Não são menos totalitaristas, autoritários e preconceituosos do que aqueles que se esganiçam contra os imigrantes e os refugiados, procurando fechar-lhes as portas e negar-lhes uma oportunidade de vida digna.

Podem aparentar tonalidades diferentes, mas a farinha é do mesmo saco. Perseguir minorias religiosas e proibir manifestações culturais profundamente enraizadas em vastas zonas – das mais urbanas e modernizadas, às mais rurais e deprimidas – não tem nada de diferente. A ambas as coisas se dá o nome de preconceito e intolerância, instrumentos com que se fabricam todos os totalitarismos.

publicado por cafe-vila-franca às 12:16

No Café Vila Franca, como nos cafés da trilogia de Álvaro Guerra, os personagens descrevem, interpretam e debatem a pequena história quotidiana da sua terra e, com visão própria, o curso da grande história de todo o mundo.
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