Num registo sério, publiquei há poucos anos um artigo numa revista holandesa tentando mostrar a razão pela qual os europeus de países do Sul são classificados pelos do Centro e Norte como PIGS, ao passo que noutras zonas do globo se exaltavam os chamados BRICS. Essas classificações são apenas preconceituosas. No fundo, são racistas, na medida a que atribuem a causas genéticas traços de caráter das pessoas.
Estas classificações constroem-se sobre estereótipos que pretensamente representam a idiossincrasia dos povos. Assentam em generalizações falsas e equivocadas. Quer quando dizem bem, quer quando dizem mal. Por exemplo, os italianos são apaixonados e as francesas liberais, os alemães são austeros enquanto os suecos se suicidam, os gregos esbanjadores e os holandeses frugais. Ou os ciganos trapaceiros e os alentejanos pessoas cheias de humor, os negros preguiçosos e os judeus agiotas, os espanhóis dramáticos e os finlandeses reservados, os russos calculistas e os portugueses saudosistas. É muito fácil, na verdade, encontrar italianos, francesas, alemães, suecos, gregos, holandeses, ciganos, alentejanos, negros, judeus, espanhóis, russos ou portugueses que não são nada como os estereótipos os descrevem. Na verdade, a esmagadora maioria de qualquer deles é bem diferente, e aqueles que correspondem à imagem, diferem de todos os compatriotas na maioria das coisas que compõem a sua personalidade.
Este tipo de preconceito racista é muito frequente. Corresponde, de facto, a representações amplamente partilhadas. E aparecem ditas ou escritas mesmo por pessoas que se dizem convictamente antirracistas. Por exemplo, no dia 22 de dezembro um editorial do jornal Público assinado por Manuel Carvalho, que em geral gosto muito de ler, com o título “os britânicos nunca caminharão sozinhos”, diz-se que os súbditos de Sua Majestade se distinguem pela “bravura e arrogância”, ao passo que os franceses apresentam um “proverbial cinismo” na forma como olham para os seus vizinhos de além Mancha. Ora, quem não conhece britânicos medrosos e humildes, e franceses francos? As generalizações abusivas são sempre perigosas, porque frequentemente o estereótipo se transforma em estigma.
A recusa deste tipo de classificações estigmatizantes é condição da construção de uma sociedade menos preconceituosa e mais aberta.